Exposição de Fotografia de Arquitetura
curadoria do Arquiteto António Choupina, numa parceria editorial com AMAG PUBLISHER
12 Out'24 ▷ 07 Jul'25
SIZA: UMA PROMENADE FOTOGÁFICA
Esta primeira incursão da Fundação Gramaxo nos universos da fotografia de arquitetura radica-se, como não poderia deixar de ser, no incontornável autor do seu edifício sede. O corpo de obra de Álvaro Siza é então revisto a partir da lente de Pedro Cardigo, que regressa à origem a preto e branco das primeiras publicações de arquitetura, do “jogo sábio, correto e magnífico dos volumes reunidos sob a luz” – como diria Le Corbusier. Pé ante pé, ambos buscam essa luz em silêncio, pacientemente revelando o (in)esperado, o enquadramento nunca antes visto, a visão rigorosa do arquiteto e o registo emotivo do fotógrafo, ou viceversa. A descoberta da revista L’Architecture d’Aujourd’Hui, no início da década de 1950, teria em Siza um enorme impacto, despontando num flash o desenho das suas obras seminais, como fotografias instantâneas. Essas obras são o primeiro momento de uma exposição em três atos, seguido de projetos mais recentes, que estarão em mostra até julho de 2025.
A cobertura inclinada da Casa de Chã da Boa Nova paira sobre os rochedos, a envolvente cerúlea e os muros alabastrinos,
que aqui se sublimam na greyscale escalonada de uma chaminé – memória do vizinho naufrágio do Veronese (1913). Na Piscina da Quinta da Conceição, um tanque franciscano é convertido em acrópole de júbilo e deleite, por entre a textura dos eucaliptos. A linha de sombra define um percurso, à semelhança da Piscina de Marés e do folclore infantil dos seus castelos de areia. Considerado um dos 100 projetos mais importantes do século XX, esta piscina não se encontra verdadeiramente à mercê das marés, como a piscinas rochosas australianas, mas antes filtra e triangula a sua implantação em relação ao porto.
Da trilogia de Leça da Palmeira até a Revolução dos Cravos, Siza procura forjar uma cidade ideal com a morte da ditadura, uma cidade modulada pela dignidade do habitar, em “que Elite signifique: todos nós” – conforme escreveu no prefácio de Uma Certa Harmonia, em 2011. Manteve a poesia da Bouça na rua com a construção de uma nova escola no Porto, enfrentando o rio Douro do alto do Gólgota. É nesse vale junto à ponte que a Faculdade de Arquitetura revisitará toda a paisagem contemporânea, na atmosfera também íntima da biblioteca onde o casco de um barco de cristal interseta a cobertura, iluminando a aprendizagem. O ritmo das torres, como o das fotografias de Pedro Cardigo, traduz uma espécie de código Morse cuja essência é a do próprio arquiteto: apenas Álvaro, como dizem os amigos e companheiros de escola.
Na sequência do maior sistema de metropolitano alguma vez edificado de um só fôlego, surge a estação subterrânea de São Bento, no local do mais crucial projeto não construído da cidade do Porto, projeto esse que parece ter ganho vida nova. Há cerca de um ano nasceu a Ala Álvaro Siza da Fundação de Serralves e posteriormente a Escultura Aberta da Fundação Lello, duas obras nas quais se destila uma espécie de arqueologia arquitetural, do assentamento na floresta primordial ao templo romano de Júpiter. Passado e futuro coexistem em relação simbiótica, como as preexistências da Quinta da Boa Vista e a nova infraestrutura da Fundação Gramaxo. A exposição fecha com fotografias em aberto de um monte em construção – a Lapa, bairro consolidado mas em permanente mutação.
PEDRO CARDIGO
Fotógrafo português, nascido em Lisboa (1976) e atualmente sediado no Porto (Portugal), com uma devoção particular pela arquitetura, pelo retrato, pela fotografia a preto e branco e analógica, própria de uma geração acabada de sair do fotojornalismo pós-revolução e prestes a entrar na criativa década de 1980.
Descobriu cedo a paixão pela fotografia, aos 8 anos, da qual se foi afastando por motivos pessoais e académicos quando, em meados da década de 1990, inicia estudos superiores em gestão e posteriormente economia. Durante a sua expressiva carreira empresarial foi desenvolvendo vários projetos como fotógrafo, vocação à qual se tem dedicado em exclusivo nos últimos quatro anos.
Com um estilo próprio, fruto de experiências em diferentes áreas — da moda até à fotografia de rua —, reconhece a sua preferência pela arquitetura, trabalho com a qual se identifica e que o aproximou das obras de Álvaro Siza. A atenção ao detalhe e às texturas conferem às suas imagens uma atmosfera claramente radicada no cinema clássico, na estética dramática de uma luz contrastante que incide sobre as cenas, à semelhança de um fotograma imaginário.